Este blog foi criado com o intuito de servir de alerta para as questões de Higiene e Segurança no trabalho, por vezes de forma mais séria e informativa, outras vezes, recorrendo ao humor.


Friday, October 21, 2011

Conflitos laborais disparam com dificuldades económicas

A difícil conjuntura económica que se vive, com muitas empresas em dificuldades e obrigadas a reduzir o número de colaboradores, tem levado ao aumento das tensões laborais com repercussões ao nível da produtividade e do ambiente de trabalho. Cabe aos empresários encontrar estratégias para atenuar o problema.

Tanto para o Estado como para as empresas, os tempos devem ser de maior contenção e produtividade. Se nalguns casos responder a tais imperativos passa por suspender contratações, noutros, mais difíceis, passará por uma política de despedimentos. Mas cumprir os mesmos objectivos, ou superá-los, com menos recursos humanos, não é tarefa fácil nem para os empresários nem para os trabalhadores. Seguidos pelo fantasma do desemprego, aqueles que permanecem nas empresas vêem-se forçados a dar tudo de si para assegurarem um volume de trabalho que, em condições normais, seria partilhado por mais colaboradores. Atenuar o stress e o conflito que minam as empresas passa por aplicar boas estratégias de motivação dos trabalhadores, das quais os líderes das empresas não podem demitir-se.

O desentendimento com o seu chefe não é novidade. Nunca reconheceu no seu superior hierárquico a capacidade de “orientar e motivar”, que considera fundamentais em quem desempenha aquela função. No entanto, revela Miguel Pedroso, o mal--estar na empresa intensificou-se nos últimos tempos, não só entre trabalhadores e chefia como entre colegas, desde que a empresa começou a suprimir recursos humanos naquele departamento.
Com uma equipa mais reduzida, o operário fabril depara-se com maior volume de trabalho, que é também mal distribuído. O principal problema, aponta, é a falta de solidariedade. Para que alguns passem o dia mais folgados, Miguel Pedroso garante passar o tempo a “correr” e a desempenhar várias “tarefas em simultâneo”. Mesmo assim, o dia não chega para tudo e, não raras vezes, tem de fazer horas extraordinárias para acabar o que devia ter sido ser feito por várias mãos.
O operário fabril sublinha que todos os colegas padecem, à sua maneira, de stress e irritação. Alguns discutem, levantam a voz. Outros passam dias a fio sem comunicar, limitando o diálogo ao estritamente necessário.
Menos recursos humanos e tarefas mal distribuídas significam mais horas de trabalho, que nem sempre deixam tempo para as refeições, também menos tempo com a família, e erros, que, na maioria das vezes, resultam de falta de comunicação e da sobreposição de tarefas, sublinha o operário.
Ana Santos, colaboradora numa grande empresa de cristalaria, também admite que a “pressão” a que têm sido submetidos os trabalhadores naquela fábrica tem sido muita, já que lhes tem sido “exigido muito mais” trabalho. E as perspectivas não são de melhoria, diz, com o final dos contratos temporários à vista.
Situações de conflito sempre existiram, antecedem por isso o actual contexto de crise, frisa, mas a irritabilidade agravou-se, principalmente quando, nos dias que correm, “qualquer pretexto pode servir para despedir”. Além da tensão afectar a qualidade da produção, contribui para o mal-estar das pessoas, ao ponto de algumas recorrerem a baixas médicas, revela. Apesar de tudo, os trabalhadores podem contar com a proximidade de vários chefes de turno, “que normalmente sabem o que se passa”.
No sector público, a diminuição de recursos humanos também está a ter impactos, considera a enfermeira Alexandra Lopes. No centro de saúde onde trabalha, as profissionais que se aposentaram não foram substituídas, situação que tem adensado o volume de trabalho.
A enfermeira reconhece que passar o dia “em correrias” pode dar azo ao erro. “Não tem acontecido, mas pode acontecer. E no nosso caso, porque lidamos com a saúde de seres humanos, não nos podemos dar a esse luxo.”
“Formamos uma equipa que se dá bem, onde não há conflito, pois tentamos dividir as tarefas e ajudar os outros quando o tempo permite”, nota a enfermeira. No entanto, trata-se de uma situação de “stress, que me deixa irritada, e da qual não consigo desligar-me quando estou em casa, o que tem reflexos na minha vida familiar”, lamenta.
António Cabeço, psiquiatra, nota que o actual momento de crise está a deixar todas as pessoas “apreensivas, preocupadas quanto ao futuro”, algumas delas em estado de “elevada ansiedade” e outras até “deprimidas, face aos encargos mensais a que deixaram de poder dar resposta”.
O médico não tem dúvidas de que o número de pessoas com problemas do foro psicológico decorrentes da situação de crise, de pressão no trabalho e desemprego poderá até ser “crescente”.
Já Aurora Teixeira, investigadora na área do Trabalho, explica, por outro lado, que o stress e o conflito têm repercussões em termos de desempenho. “Mesmo que implícitos, os conflitos custam à empresa baixas de produtividade.” São situações “potencialmente negativas para a empresa”, admite.
A investigadora lembra, no entanto, que “as empresas sempre foram exigentes com os seus funcionários”, sem terem por hábito “desperdiçar os seus talentos”. O problema, defende, é que os trabalhadores se sentem hoje mais “pressionados para ter coisas” e, em tempo de crise, “não há recursos que o permitam”.

Solução passa por comunicação “fluída e atempada”
Evitar conflitos e obter organizações positivas passa, acima de tudo, por manter uma comunicação “fluída e atempada” nas empresas, defende Aurora Teixeira. Para a investigadora da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, é fundamental que as chefias, e posteriormente as chefias intermédias, “abram o jogo”, dizendo claramente que função tem de cumprir cada colaborador. É preciso que cada um saiba, no devido momento, até onde vão as suas competências, e até quando poderá estar mais sobrecarregado. Essa informação vai evitar conflitualidade entre pares e diminuir a angústia do colaborador, que saberá que o sacrifício exigido terá um término mais ou menos definido no tempo.
Outras práticas mais criativas, como as que têm lugar em grandes empresas como a Google, exemplifica a investigadora, “não são importáveis nem comparáveis com outros sectores, como as indústrias dos têxteis ou do vidro”. A Google, sublinha, “só pode oferecer práticas de motivação tal como oferece, porque trabalha com pessoas altamente qualificadas, com salários acima da média, o que não se passa com indústrias, onde os ritmos são comandados por máquinas”, nota a docente.
Mário Ceitil, professor universitário nas áreas da Psicologia das Organizações e da Gestão de Recursos Humanos, também considera que a melhor maneira dos empresários lidarem com o stress dos seus trabalhadores e evitarem conflitos internos é manter o “diálogo aberto” com toda a gente e “transmitir confiança” no projecto.
“As organizações têm de gerar confiança, através de exemplos de integridade. As pessoas não podem sentir que existem nas empresas jogos menos claros ou de influência. Essa confiança é fundamental para que o tecido de uma organização não se desagregue.”
O docente nota que todos precisam de acreditar que estão a trabalhar em prol de um valor, um projecto comum, pelo qual vale a pena se sacrificarem. “Essa força anímica resulta do facto de acreditarem na força comum”.
Uma atitude positiva deste género exige grande capacidade de liderança da parte de todos os directores e chefes das empresas. “A cultura de confiança deve ser segregada a todos os níveis da hierarquia”, recomenda Mário Ceitil.
Outra competência importante para um líder é o seu sentido de realidade. Embora deva transmitir confiança, “não pode gerar expectativas fantasiosas” nos colaboradores.
É tão importante para os trabalhadores saberem da situação de crise da sua empresa como um paciente ser informado da sua doença grave. Só consciente da gravidade da sua situação percebe o quão importante pode ser a sua força anímica para superar a enfermidade, compara o professor.
Até quando não há mais nada a fazer e a rescisão é a única solução possível, cabe ao líder transmitir que o despedimento nada tem de pessoal e explicar de forma “inequívoca” quais são as razões ou critérios da empresa que motivam tal decisão. “É preciso manter clareza e salvaguardar a dignidade da pessoa, a sua força anímica”, até para que esta continue motivada para procurar novo emprego, sublinha o docente universitário. Infelizmente, aponta , existe hoje “uma crise de liderança na liderança na crise”.
Ao longo de três gerações, a empresa familiar Rações Veríssimo, de Leiria, tem sabido como contornar a crise. Manuel António Veríssimo, presidente do conselho de administração, diz que a sua actuação tem passado por reuniões periódicas com todos os colaboradores, desde a área administrativa aos trabalhadores indiferenciados, que servem para explicar o que se passa, fazer previsões, ou seja, antever o futuro de forma a poder corrigir procedimentos atempadamente.
Diz ter comunicado aos colaboradores que o sector dos alimentos para animais atravessa um momento “desfavorável”, mas que, apesar disso, “com bom-senso e a colaboração de todos” vão conseguir ultrapassar. Transmitiu ainda as suas previsões, de que “a crise vai durar todo o ano 2012”, frisando que, se conseguirem ultrapassá-la, “não vai haver despedimentos nem cortes nas regalias sociais, à excepção daquelas que o Governo impõe”. Além disso, revelou não pensar em “usar a meia hora proposta pelo Governo, porque o horário actual permite fazer todo o trabalho”.
Informados sobre a realidade da empresa, os trabalhadores sentem-se “tranquilos”, observa Manuel António Veríssimo. “E têm vontade de trabalhar”, acrescenta. Se mais não fazem é porque não tem havido mais encomendas, nota o presidente. n

Prevenir depressões a partir do emprego
No que respeita à redução dos impactos do stress na saúde dos colaboradores, começa a ser prática entre grandes empresas europeias e norte- -americanas investir na prevenção das doenças mentais no local de trabalho.
Ricardo Gusmão, coordenador em Portugal da Aliança Europeia Contra a Depressão, disse à Lusa que multinacionais em Inglaterra, Alemanha ou Estados Unidos têm já programas de prevenção da doença mental, “com retornos de produtividade evidentes”. E, “sendo Portugal o segundo País do mundo com maior taxa de perturbações mentais”, as empresas nacionais deviam começar a fazer o mesmo, defendeu o médico.
“Não vemos as empresas portuguesas a investir neste tipo de prevenção, quando as doenças mentais contribuem para elevado absentismo e perda de produtividade”, argumenta o psiquiatra e professor na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa.
Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, a depressão é das maiores causas de incapacidade em todo o mundo e, em Portugal, dados da Caixa Geral de Aposentação colocam-na também no topo dos motivos de aposentação precoce.
Ter psicólogos nos recursos humanos das empresas vocacionados para despistar problemas mentais é uma das medidas que Ricardo Gusmão defende, a par de outras mais simples, como ter uma creche no local de trabalho.
“As empresas que se preocupam com a saúde mental dos colaboradores têm produtividade muito superior às outras e os custos são relativamente marginais”, sustenta.
Os dados internacionais indicam que a depressão é uma das doenças psiquiátricas mais frequentes, que afetará uma em cada cinco pessoas em algum momento das suas vidas.
Em 1990, a Organização Mundial de Saúde determinou que a depressão é a quarta maior causa de anos de vida saudáveis perdidos em todo o mundo. Dez anos depois já era a terceira causa e em 2020 estima-se que seja a segunda.
O psiquiatra António Cabeço lembra que as pessoas têm de se sentir gratificadas, não só financeira como emocionalmente para se manterem concentradas e produtivas. E dada a correria a que hoje estão sujeitas, o médico defende que “qualquer empresa evoluída deve ter departamento de recursos humanos”, para fazer face à situação.
“A tendência das empresas tem de ser essa”, frisa o psiquiatra. “Investir em gabinetes de recursos humanos, com psicólogos e formação de quadros, pode ter retorno de produtividade superior ao investimento realizado no departamento.”
Mário Ceitil refere, por sua vez, que aos gabinetes de recursos humanos compete apenas encontrar políticas, estratégias de motivação, que cabe aos líderes da empresa executar.
E sobre os conflitos entre trabalhadores, Mário Ceitil termina com algumas considerações. Primeiro: não somos obrigados a gostar das pessoas com quem trabalhamos. Segundo: as empresas não devem contratar pessoas porque se dão bem, mas de acordo com critérios profissionais. Terceiro: todos devem ter inteligência emocional para impedir que relações com o outro interfiram na sua performance profissional.

Autor: Daniela Franco Sousa, in http://www.jornaldeleiria.pt

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